Indústria corta custos, poupa energia e faz reparos a distância

Indústrias de diversos setores estão investindo em inteligência artificial para melhorar processos fabris e aumentar a produtividade. Um benefício adicional da tecnologia é viabilizar avanços nas metas ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês), cada vez mais valorizadas pelos investidores. Sistemas automatizados que “aprendem” com o uso podem aumentar a eficiência energética, reduzir a emissão de gases do efeito-estufa, economizar água e dar mais segurança aos trabalhadores, além de ajudar na “previsão do futuro”, ao anteciparem a ocorrência de falhas nas máquinas e equipamentos.

“Queremos parar de olhar pelo retrovisor e olhar para a frente”, diz o gerente do programa de transformação digital para operações da Nestlé Brasil, Gustavo Moura. “Conseguimos fazer isso com sensores que identificam tendências e padrões, e com pessoas habilitadas para obter informações relevantes a partir do conjunto de dados”. A multinacional suíça de alimentos reduziu em 60% o consumo de gás natural na fábrica de biscoitos de Marília (SP), ao analisar a configuração ideal de funcionamento do forno. Um modelo matemático indica quando é melhor desligá-lo ou mantê-lo em hibernação com consumo mínimo.

A Nestlé tinha uma dificuldade recorrente na sua linha de leite em pó, em especial nos dias úmidos: o entupimento na torre de secagem do produto, que demandava paradas não-planejadas de até cinco horas para manutenção. O problema foi resolvido com a adoção de um sistema digital que monitora temperatura, pressão e diferencial de pressão. Ele dispara um alerta com até 15 minutos de antecedência, dando condições ao operador para mudar os parâmetros. “Temos mais de 500 sensores instalados em diferentes máquinas, e em alguns casos recebemos alertas com dois dias de antecedência”, conta Moura.

Com mais de 600 mil veículos conectados no mundo e 63 mil no Brasil, a Scania aposta na sensorização da frota e na oferta de serviços inteligentes para o transporte de cargas. “Desde 2016, os veículos já saem de fábrica com o módulo de conectividade instalado”, diz o diretor de serviços da Scania Brasil, Marcelo Montanha. A empresa estima que, em três anos de operação, os caminhões da nova geração já deixaram de emitir 1 milhão de toneladas de CO2, em parte como resultado do acompanhamento do desempenho dos motoristas.

“As ferramentas de gestão inteligente fizeram a disponibilidade dos veículos crescer dois pontos percentuais, passando de 96% para 98%, além de reduzir em 20% o consumo de combustível”, relata o executivo. Muitos clientes da empresa usam o software de monitoramento da frota Scania FIT para premiar os motoristas que apresentam melhor desempenho. Na nova linha de caminhões P8/Euro6, que chegam ao mercado em 2023, a conectividade viabiliza o programa de manutenção em intervalos flexíveis, que resulta na redução de até 25% nos custos de reparação e manutenção preventiva, segundo a empresa.

A indústria de celulose Veracel, localizada no sul da Bahia, usa inteligência artificial para consolidar o conceito de estabilização da fábrica, isto é, a previsibilidade das operações. “A ideia é evitar surpresas de todas as formas”, resume o diretor industrial Ari Medeiros. Há um ano a empresa criou uma sala de confiabilidade para centralizar a gestão das informações captadas por 1,2 mil sensores de vibração e temperatura em toda a planta. “Preenchemos essa sala com competência humana, que garante o planejamento e a gestão adequados”, completa. Um software de manutenção prescritiva utilizado pela empresa consegue predizer falhas de equipamentos com até seis semanas de antecedência.

Desde abril, a União Química usa dispositivos portáteis de realidade aumentada para que especialistas orientem remotamente o reparo de equipamentos. Os óculos aumentam a eficiência operacional, a segurança e a assertividade, avalia o diretor de TI Guilhermo Fragelli. “Antes, era preciso deslocar técnicos de outras unidades, muitas vezes de outros Estados, ou tirar fotos e descrever processos de reparo”, diz. “Hoje realizamos o trabalho remotamente, com agilidade e em tempo real”. A tecnologia já é utilizada em três fábricas e o objetivo da farmacêutica é implantá-la em suas dez unidades até o fim de 2023.

O uso da realidade aumentada também está associado à impressão 3D, que há dois anos tem sido empregada pela União Química para produzir nove tipos de peças para diversas máquinas. A empresa também faz manutenção preditiva por meio de softwares de IA.

Fonte: Valor Econômico